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Abordagens restaurativas dão a tônica na conclusão do Autocompor Brasil

Evento do MPRN e do CNMP foi em alusão aos 10 anos da Política Nacional de Incentivo à Autocomposição
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O segundo dia do Autocompor Brasil debateu abordagens restaurativas para o Ministério Público como a negociação, a mediação e o mapeamento de conflitos para construir consensos. O congresso, realizado pelo Ministério Público do Rio Grande do Norte (MPRN) e Conselho Nacional do Ministério Público (CNMP), foi encerrado nesta sexta-feira (23) na sede do MPRN, em Natal. O evento contou com transmissão simultânea pelo canal do YouTube das duas instituições.

A manhã começou com a conferência “Ainda é possível trocar as lentes e focar restaurativamente em um mundo cada vez mais polarizado?” com a condução do promotor de Justiça do Ministério Público do Rio Grande do Sul (MPRS), Sérgio da Fonseca Diefenbach.

O painelista falou sobre como a negociação direta, a mediação e a conciliação podem ser ferramentas essenciais para construir consensos, mesmo diante de diferenças e desavenças históricas e culturais. E enfatizou a necessidade de “olhar o mundo com os olhos do outro” como ponto de partida para a Justiça Restaurativa.

Também ilustrou a polarização como uma realidade constante na história da humanidade, mas que pode ser superada através de encontros e escuta atenta, buscando as necessidades reais das pessoas em vez de aplicar soluções pré-definidas.

O professor do curso de Direito da Universidade Federal do Semi-Árido (Ufersa), Ramon Rebouças abordou a polarização sob a ótica da desumanização e estigmatização do “outro”, especialmente em contextos de conflito. Rebouças defendeu a necessidade urgente de criar outros canais de comunicação, especialmente em tempos de intolerância, incentivando um convite “arriscado, perigoso, doloroso” para que as pessoas se sentem, olhem para o outro e se reconheçam um pouco nele.

Ferramentas aplicadas ao Ministério Público

O promotor de Justiça do MPRN Marcus Aurélio de Freitas Barros abordou a temática “Negociação direta e convenções processuais aplicadas ao Ministério Público” junto com a promotora de Justiça do Ministério Público de Santa Catarina (MPSC), Analu Longo.

A representante do MPSC destacou a importância da Resolução 118 como um marco para a autocomposição no Ministério Público, apresentando-a como uma “caixa de ferramentas” que inclui negociação, mediação, conciliação, convenções processuais e práticas restaurativas. Analu Longo frisou que essa caixa não se restringe a grandes conflitos coletivos, mas é aplicável ao dia a dia da Promotoria de Justiça, desde transações penais até acordos de leniência, promovendo a prioridade da autocomposição antes da judicialização.

Como painelista, Marcus Aurélio falou sobre a aplicação da negociação em problemas complexos, especialmente os de natureza estrutural. Ele expandiu o conceito além das questões ambientais, citando exemplos na área de família, onde planos individuais de atendimento e a reunião de toda a rede de atenção são fundamentais. O promotor de Justiça compartilhou sua experiência no Rio Grande do Norte com a implementação da Lei do Sinase, em 2012, quando enfrentaram um sistema socioeducativo precário. Contou que a negociação estrutural vai além do simples acordo, exigindo um planejamento estratégico e a colaboração de diversas instituições, tanto públicas quanto privadas, para buscar soluções duradouras e impactantes em problemas que afetam a sociedade de forma abrangente.

A quarta palestra do dia ficou a cargo da promotora de Justiça do MPRS, Ivana Kist Huppes Ferrazzo, e do assessor do NUIP do Ministério Público de São Paulo (MPSP), Adolfo Braga sobre “Mediação e conciliação aplicadas ao Ministério Público”.

A promotora Ivana Kist Huppes Ferrazzo, falando como mediadora e praticante, apresentou a experiência do Rio Grande do Sul com a mediação avaliativa, que permite a participação complementar do mediador na geração de soluções, especialmente em casos grandes. Ivana enfatizou o trabalho em equipe do núcleo de mediadores e a relevância da localização da sala de mediação, próxima ao procurador-geral de Justiça, como um indicativo do apoio institucional.

Ainda em sua fala, a representante do MPRS lembrou da necessidade da coleta de dados para medir a resolutividade e a abrangência da atuação em diversas áreas do Ministério Público apontando para a importância do mapeamento de interesses e da mesclagem de técnicas, como a Justiça Restaurativa.

“A nossa intenção é levar transformação, transformação social, transformação física, levar uma justiça mais próxima, uma justiça com valor, não uma justiça com poder, né?”, disse Adolfo Braga Neto ao fazer um convite para repensar a prática da mediação, propondo que se abandone o termo “audiência” em favor de “reunião de mediação”, encarada como um encontro de trabalho focado na construção de um futuro satisfatório para as partes.

Ele destacou que, ao contrário do passado imutável, o presente oferece a oportunidade do diálogo, mas é a perspectiva de futuro que realmente motiva o cumprimento dos acordos, pois estes fazem sentido e promovem o comprometimento das pessoas.

A chefe do Setor de Autocomposição do MPRN, Evelyne Cerqueira, ponderou que é preciso capacitar os profissionais. “Fazer mediação não é simplesmente juntar as pessoas para um diálogo sem técnicas. Na Justiça Restaurativa a nossa intenção não é causar mais danos e se não estamos preparados, nós poderemos causar mais danos. Então, que a gente tenha esse cuidado”, reforçou.

Mapeamento de conflitos

Por fim, o evento foi encerrado com o painel “Mapeamento de conflitos e construção de consensos” com o procurador do Ministério Público Federal do Ceará (MPF-CE) e secretário do Comitê Permanente Nacional de Fomento à Atuação Resolutiva (Conafar), Alessander Sales e o coordenador administrativo da UNCMP, Vladimir da Matta Gonçalves Borges.

Vladimir da Matta explicou que identificar o “episódio” (a expressão visível do conflito) é o caminho para chegar ao “epicentro” (os padrões de relacionamento subjacentes), assim como a observação precede o entendimento de sentimentos e necessidades na comunicação não violenta. O painelista sugeriu utilizar três P’s (pessoas, problema e processo) para o mapeamento como uma abordagem básica e instrumental.

Depois, detalhou a importância de identificar os atores (primários, secundários e terciários) e suas interdependências, além de considerar os interesses de médio e longo prazo para o sucesso das negociações.

“Tem que entender o conflito, escolher a ferramenta certa e saber mexer com a ferramenta. Se não souber, não adianta. Quando você desenvolve essas etapas, desenha o mapa de disputa. O seu desenho da disputa é a preparação para a atuação”, observou Alessander Sales, destacando que os conflitos complexos tem múltiplas partes, visões e informações, além de posições historicamente antagônicas.

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