Equipes que trabalham em abrigos devem ter cuidado para evitar vínculo precipitado com padrinhos
O Ministério Público do Rio Grande do Norte, por meio da 12ª Promotoria de Justiça de Mossoró, está orientando uma série de medidas que devem ser seguidas pelos dirigentes de entidades de acolhimento institucional do Município. A recomendação também é direcionada às respectivas equipes técnicas interprofissionais que trabalham nos abrigos e à secretária de Desenvolvimento Social e Juventude de Mossoró.
A primeira medida é que os dirigentes, na qualidade de guardiões legais dos meninos e meninas acolhidos, tomem maiores cautelas, com o apoio das equipes, para evitar a formação indevida de vínculos afetivos entre adultos padrinhos e crianças. O intuito é evitar que se criem expectativas na mente dos pequenos que não poderão ser plenamente satisfeitas. Assim, esse cuidado deve ser redobrado para os casos de crianças e adolescentes com possibilidades de reintegração à família de origem ou extensa – ou à família substituta na forma de adoção.
Assim, a inserção da criança ou adolescente no programa de apadrinhamento só deve ser iniciada após a prévia autorização judicial. Em relação ao programa o MPRN recomenda a adaptação de metodologias e projeto político pedagógico à equipe dos acolhimentos, coordenação e equipe técnica.
Quanto à secretária de Desenvolvimento Social e Juventude de Mossoró, a unidade ministerial quer que a gestora faça as orientações legais e normativas junto às equipes das entidades de acolhimento de crianças e adolescentes de Mossoró (coordenadores, equipe técnica, cuidadores e pessoal de apoio) alusivas à colocação de criança e adolescente em programa de apadrinhamento.
A Promotoria de Justiça especializada na defesa da criança e do adolescente ainda recomendou à secretária municipal que realize de capacitações específicas para os serviços de acolhimento – preferencialmente que sejam sobre temas como psicologia e desenvolvimento infantojuvenil, impactos do acolhimento no desenvolvimento da criança e do adolescente, a importância da constituição do afeto na vida dos petizes, o fortalecimento dos vínculos familiares e as cautelas que se requerem para evitar a formação de vínculos com terceiras pessoas não-familiares que venham a ser danosos.
Vínculo irregular, criança desprotegida afetivamente
Para emitir a recomendação, foi levado em consideração um caso específico em que pretendentes à adoção tiveram acesso a uma criança na faixa etária da primeira infância (0 a 6 anos). O casal estabeleceu vínculo irregular com o pequeno, pois o levavam para a casa deles por sucessivos finais de semana e vários outros dias, além de terem passado a acompanhar a rotina escolar e de saúde (levando-o a médicos). Ao final dessa aproximação, a criança já estavam chamando-os de pai e de mãe.
Porém, os pais biológicos da criança ainda não foram destituídos do poder familiar, estando essa discussão aberta em processo judicial. Além disso, o casal pretendente formulou pedido de adoção da criança e apesar de habilitados no cadastro local de adoção, não estavam aptos ao pedido conforme a ordem cronológica das habilitações de Mossoró. Outro agravante no caso foi o acesso à criança facilitado porque um dos pretendentes é funcionário da Secretaria de Desenvolvimento Social e Juventude de Mossoró, o que lhe garante entrada livre nas unidades de acolhimento institucional de crianças e adolescentes desta cidade.
A Promotoria de Justiça considera que o vínculo indicado não atende aos requisitos de ética, proteção e justiça aos direitos da criança, pois é prematuro, já que os pais biológicos do garoto ainda não foram destituídos do seu familiar. Mesmo que os genitores venham a ser destituídos do seu poder parental, o casal pretendente à adoção não deverá ter a criança encaminhada para si, por não estar no topo da fila do cadastro local de habilitados.
Portanto, o vínculo formado entre os pretendentes e a criança não poderá ser satisfeito, ao que tudo indica. Dessa forma, o petiz deverá doravante passar por dois processos de luto: o primeiro, pelo eventual rompimento do vínculo com seus pais biológicos; e o segundo, pelo futuro rompimento do vínculo com seus “novos” pais, socioafetivos. Essa situação viola os direitos da criança acolhida, em decorrência da falta de cautelas na formação dos vínculos afetivos.
Confira aqui a recomendação.